sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Trabalho Escravo Contemporâneo

O trabalho como direito humano

A ideia de trabalho está diretamente relacionada aos símbolos de pertencimento e dignidade. É um elemento definidor do próprio ser do homem ou da sua dimensão ontológica, ou seja, o trabalho gera as condições reais de sua possibilidade de existência.

O trabalho é definido por Karl Marx como a atividade sobre a qual o ser humano emprega sua força para produzir os meios para o seu sustento. É ao mesmo tempo um direito e uma obrigação de cada indivíduo. Como direito, deflui diretamente do direito à vida. Para viver, tem o homem de trabalhar. A ordem econômica que lhe rejeitar o trabalho, lhe recusa o direito a sobreviver. Como obrigação, deriva do fato de viver o homem em sociedade, de tal sorte que o todo depende da colaboração de cada um.

Antigamente, existia a crença de que o trabalho devia ser realizado apenas pelos escravos ou pobres, que haviam sido destinados à isso. Já a nobreza, não o praticava, pelo simples motivo de que poderiam perder sua dignidade. Seguindo este conceito, a escravidão foi considerada uma das primeiras formas de trabalho.

Após a Revolução Industrial, houve uma série de transformação nas condições do trabalho. Devido ao desemprego pela substituição do homem por máquinas, a situação dos trabalhadores tornou-se precária, o que gerou revoltas sociais, que deram origem às primeiras leis trabalhistas.

·         O que é Direito Trabalhista?

O direito trabalhista é uma das principais áreas do direito que trata das relações de trabalho, está concentrado em dois personagens principais, o primeiro, é representado pela figura do empregado, e o segundo do empregador. O objetivo é assegurar os direitos e deveres dos trabalhadores, garantindo sua dignidade e diminuindo a exploração.

Mesmo sendo criticada por suas leis consideradas exageradas, seu objetivo é agir em benefício tanto do trabalhador urbano e rural, quanto do empregador. No Brasil, a primeira Constituição a tratar do Direito Trabalhista foi a de 1934. A partir daí, até a de 1988, houve o desejo de acrescentar à Lei direitos relativos ao trabalho, tais como jornada, adicional de horas extras, direito à licença maternidade, adicional do salário de férias, dentre outros, que são aqueles que devem prevalecer até que sejam aprovadas leis complementares.

Esses direitos estão presentes do artigo 6º ao 11º da Constituição Federal de 1988 e, portanto, devem ser respeitados e cumpridos. Mesmo assim, existem muitas regras que não tem aplicações, pois necessitam de uma lei complementar ou ordinária para que se tornem válidas.

O que é trabalho escravo contemporâneo?

Em 1888, a lei Áurea – que supostamente garantiu a libertação dos escravos – foi assinada pela princesa Isabel de Alcântara no Brasil e, com isso, a grande maioria da população contemporânea acredita que não há mais trabalho escravo, que é uma relação ultrapassada – o que, de fato, é. Porém, aqui discutiremos a existência do trabalho escravo na atualidade, o qual tem divergências do trabalho escravo colonial. Mas então, o que é o trabalho escravo?
Segundo a Constituição Brasileira, o trabalho escravo “caracteriza-se pela sujeição do trabalhador a empregador, tomador dos serviços ou preposto, independentemente de consentimento, a relação mediante fraude, violência, ameaça ou coação de quaisquer espécies” – ou seja, qualquer relação de trabalho, aceita pelo trabalhador ou não, que foi fundamentada em violência, mentiras, fraude e/ou chantagens.
            O trabalho escravo contemporâneo, formalmente chamado de “condição análoga à escravidão”, é mais comum do que se parece e acontece em todo o mundo. Primeiramente, devemos saber as principais diferenças entre o trabalho escravo contemporâneo e o colonial, como mostra a tabela abaixo:
Tipo de trabalho     escravo
Diferenças étnicas
Propriedade de uma pessoa sobre a outra
Tempo de relacionamento
Manutenção da ordem
Colonial



Relevantes



Permitida



Longo
Ameaças, violência psicológica, coerção física, punições exemplares e até assassinatos



Contemporâneo


Pouco relevantes


Não permitida (não é recorrente)



Curto
Ameaças, violência psicológica, coerção física, punições exemplares e até assassinatos
                                                                                     
            Conclui-se então que o trabalho escravo contemporâneo existe, apesar de ter diferenças com relação ao colonial, e deve ser combatido, tal como qualquer outra anomalia que insulte a dignidade do homem, que arrisque sua vida ou que o submeta a condições precárias.

Ciclo do trabalho escravo
Como já foi visto, os agentes da escravidão contemporânea se apossam da vulnerabilidade de pessoas em situações precárias, com ótimas ofertas de trabalho para a melhoria da vida delas – que, muitas vezes, envolvem migração do trabalhador. Já estabelecido nas condições abusivas, o empregado tem duas opções: fugir ou morrer (seja por estar fugindo ou por ter se submetido às condições subumanas do local). Portanto, no melhor dos cenários, o empregado foge, procura a fiscalização (polícia, sindicatos ou entidades que assegurem os direitos trabalhistas), tem seus direitos assegurados e é liberto – consolidando assim o combate ao trabalho análogo à escravidão.




Fonte: Google Imagens

Onde acontece o trabalho escravo contemporâneo?

O trabalho escravo contemporâneo, como já foi visto anteriormente, se consolida em cidadãos que vivem em situação precária de extrema pobreza. Outro fator que influencia na questão dos explorados pertencerem a esse extenso grupo é o fato de possuírem baixa- ou nenhuma- escolaridade, o que faz com que sejam desinstruídos e não tenham total noção acerca de certas realidades.
            Em virtude dos fatos anteriormente citados, é de se imaginar que esse tipo de trabalho explorador se concentre nos lugares ou regiões -tanto do Brasil quanto do mundo- cuja pobreza seja predominante entre a determinada população. No Brasil a maioria dos explorados está concentrada na área norte do país, mas é importante ressaltar que esse tipo de ilegalidade não se restringe a somente esse espaço ou regiões próximas, mas também em grandes metrópoles, como na cidade de São Paulo.
O que difere o trabalho análogo ao escravo nessas duas regiões tão distintas economicamente falando é o tipo de serviço realizado. Em estados como o do Pará, por exemplo, os tipos de exploração se ligam à atividades relacionadas a agropecuária, e em estados como o de São Paulo se ligam a atividades em âmbito mais urbano, como o de construção civil.
            Em suma, é importante dizer que, independentemente da região ou tipo de serviço realizado pelo explorado, a escravidão contemporânea infelizmente ainda persiste e cabe à sociedade como um todo lutar de forma geral para que essa terrível e retrógada forma de lucro seja extinta de uma vez por todas.
Como o trabalhador se torna escravo?

Atualmente, a maneira de adquirir mão de obra escrava, é através do “gato”, um método em que o patrão faz falsas promessas de salário, garantindo uma significativa melhora na qualidade de vida. Os gatos chegam de maneira agradável para parecerem confiáveis e então colocam os empregados em difíceis situações, sem a possibilidade de se desvincular. É comum pegarem pessoas de regiões distantes do local onde serão escravizados, e para “as conquistarem”, oferecem adiantamentos e transporte gratuito. Porém, ao chegarem, se deparam com algo totalmente diferente do esperado, o patrão já informa que o empregado possui dívidas, pelo dinheiro adiantado, transporte, alimentação, alojamento e até pelos instrumentos de trabalho que serão necessários, sem contar que os preços são muito acima do comum. Os empregados então são obrigados a trabalhar até quitarem todas as suas dívidas, que só tendem a aumentar.

 Tipos de trabalhos escravo no Brasil:

  • TRABALHO FORÇADO: o indivíduo é obrigado a se submeter à condições de trabalho em que é explorado, sem possibilidade de deixar o local, seja por causa de dívidas, por ameaças e violência física ou psicológica.
  •  JORNADA EXAUSTIVA: expediente desgastante que vai além de horas extras e coloca em risco a integridade física do trabalhador, já que o intervalo entre as jornadas é insuficiente para a reposição de energia. Há casos em que o descanso semanal não é respeitado. Assim, o trabalhador também fica impedido de manter vida social e familiar.
  • SERVIDÃO POR DÍVIDA: fabricação de dívidas ilegais referentes à gastos com transporte, alimentação, aluguel e ferramentas de trabalho. Esses itens são cobrados de forma abusiva e descontados do salário do trabalhador, que permanece cerceado por uma dívida fraudulenta;
·         CONDIÇÕES DEGRADANTES: um conjunto de elementos irregulares que caracterizam a precariedade do trabalho e das condições de vida sob a qual o trabalhador é submetido, atentando contra a sua dignidade.



Quem escraviza no Brasil?

Normalmente, são grandes fazendeiros, pecuaristas, agricultores, administradores e até mesmo grandes empresas. Conhecidos como “gatos”. São médios e grandes proprietários de terras, a maioria tem ensino superior completo. Grande parte é da região Sudeste, mas suas propriedades e empresas encontram-se nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste do país.

Ações de combate ao trabalho escravo

            É necessário combater o trabalho escravo contemporâneo. Mas como isso ocorre? De que forma se acaba com um problema tão sério e que gera tanto sofrimento? Por se tratar de um processo existente desde os primórdios da civilização, a escravidão é uma doença difícil de curar, mas que tem remédio. 

Como sabemos, a educação é a base de tudo. Não seria diferente com relação a essa modalidade de exploração. Partindo do princípio de que a educação abre portas, podemos entender a importância da mesma para o fim desse ciclo vicioso. Muitos trabalhadores se veem obrigados a aceitar cumprir atividades absurdamente exaustivas por não terem outra opção. Sem formação, informação ou qualificação, as pessoas acabam por ter de se sujeitar a trabalhos muitas das vezes desumanos. A melhor forma de prevenir essa situação é educando e assim alertando dos perigos de concordar a prestar serviços aos indivíduos envolvidos nesse tipo de crime.

Mesmo depois que alguém é vítima de trabalhos escravo contemporâneo, há artifícios de amenizar os traumas (físicos e principalmente psicológicos) e auxiliar aqueles que foram lesados. Acolhimento e inserção em programas sociais assistenciais são de extrema relevância para a recuperação desses homens e mulheres. Eles caracterizam o socorro necessário para que os resgatados não sejam novamente colocados em condições abusivas de trabalho. O desenvolvimento econômico e social das populações vulneráveis é essencial.

Entretanto, a prevenção só se fortalece com a coibição de tais atos. Atualmente existem instrumentos legislativos que protegem os trabalhadores dessas armadilhas. Projetos como a "PEC do trabalho escravo", o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado, o Primeiro e Segundo Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo e o Sistema de Acompanhamento e Combate ao Trabalho Escravo são esforços feitos com o propósito de extinguir esse mal. A fiscalização governamental e a punição dos responsáveis por essa espécie de atrocidade são fatores decisivos no combate ao trabalho escravo contemporâneo.

Repreensão ao trabalho análogo a escravidão no Brasil

Desde 1995, está em vigor no Brasil seu sistema de combate ao trabalho análogo a escravidão. À partir disso, mais de 3 mil propriedades foram fiscalizadas por denúncias de trabalho escravo e mais de 45 mil pessoas ganharam a liberdade. Em 2013, mais de 1.500 trabalhadores foram libertos. A maioria deles vinda das áreas urbanas.

No Brasil, o conceito de trabalho escravo consta no artigo 149 do Código Penal desde 1940, sendo revisado e reforçado em 2003. Há um projeto de emenda constitucional (PEC 438) que busca criar um novo meio de punir fazendeiros que se aproveitam de mão de obra escrava; caso sejam pegos e condenados, suas terras devem ser desapropriadas e destinadas à reforma agrária. O projeto está tramitando desde 2001 no Congresso Brasileiro, mas, desde então, obteve poucos avanços. Isso mostra que muitos grupos econômicos ainda legitimam essa prática.

O Brasil realmente assumiu a existência do trabalho escravo contemporâneo em 1995, quando criou o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM) e o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado (GERTF), no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego. Desde 2003 foram criados os planos nacionais de erradicação do trabalho escravo, dando novas possibilidades para o enfrentamento do problema. O Brasil também criou a Lista Suja. Essa lista disponibiliza ao público o nome de empresas que foram descobertas utilizando trabalho escravo. Isso também bloqueia relações comerciais com essas empresas.


Em 2005 foi criado o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. Uma forma de mobilização das empresas. O pacto apóia formas de promover o trabalho decente, reintegrar o trabalhador em situação vulnerável na sociedade e campanhas de conscientização sobre o assunto.O Brasil é reconhecido internacionalmente pelos seus esforços pela erradicação desta prática abominável, mas ainda temos muito o que fazer para nos livrarmos deste mal. Ainda há um caminho a percorrer, mas um grande passo já foi dado.


Como está a fiscalização do trabalho hoje?

A crise econômica pela qual o Brasil passa atualmente vem requerendo reformas e cortes de gastos. Dessa forma, entidades vitalícias já vêm perdendo recursos para o funcionamento; a PRF (Polícia Rodoviária Federal) reduziu o patrulhamento das estradas, a emissão de passaportes foi suspensa por um mês em 2017 e  a quantidade de estabelecimentos fiscalizados, com relação às condições dos empregados, no primeiro semestre caiu para menos da metade em comparação com 2016.

Segundo matéria do jornal G1, em 2017, no atual governo Temer, parte da verba para fiscalização do trabalho análogo à escravidão e infantil foi cortada. De acordo com o Ministério de Trabalho, essa medida não irá afetar o funcionamento dessas atividades, e tudo será minimamente regulamentado para que não seja prejudicado.

 Os sindicatos, porém, afirmam que precisam de 3 milhões de reais para cobrir as despesas das fiscalizações e, com o corte, foram disponibilizados apenas 1,6 milhões – sendo que, para o ano de 2017, essa verba já está comprometida. Assim sendo, a fiscalização do trabalho – principalmente no interior dos estados – será radicalmente afetada, uma vez que precisa de mais recursos para ser realizada.

Além disso, já havia sido constatado que o resgate e libertação de trabalhadores em situações problemáticas de ocupação estava diminuindo com o passar dos anos, surgindo assim a suspeita de que esse tipo de trabalho estava se tornando cada vez mais invisível – o que é bastante preocupante, de acordo com os direitos que deviam ser assegurados à cada indivíduo – segundo o coordenador da CPT (Comissão Pastoral da Terra¹).


1. A CPT foi criada para ser um serviço à causa dos trabalhadores e trabalhadoras do campo e para ser um suporte para a sua organização.